O regaleco e a importância do ânus
O regaleco, também conhecido como peixe-remo, rei-dos-arenques e muitos outros nomes, é um animal interessante, principalmente porque nos consegue fazer refletir sobre a extraordinária flexibilidade e exuberância da vida. Ao longo da história, deambulou pela imaginação dos homens do mar, travestido de serpente gigante capaz de afundar barcos e devorar marinheiros. Nada na vertical, com o seu corpo esguio que chega a ultrapassar a dezena de metros e faz dele o mais comprido peixe ósseo do mundo, que se saiba. À noite, sobe das profundezas afóticas às águas da penumbra diurna, guiado pelas suas narinas bucais. Porém, não são estas características que o destacam, aquilo que mais me seduz nele é o facto de poder, a qualquer momento, abandonar partes significativas do seu corpo para não ter de as alimentar. Maravilha! Começa pelas zonas posteriores da cauda e pode ir até à região do ânus, reduzindo-se assim a cerca de um terço do tamanho. Não sofre com estas extrações, porque não tem sensibilidade à dor nessa parte do corpo. Já o aconselhei a utilizar a cauda como seu próprio alimento mas ela é tão intragável que nem ele a quer. Este comportamento de excelente requinte adaptativo serve para demonstrar o relevo do ânus na bicharada em geral e nos humanos em particular. Podemos prescindir de muita coisa mas nunca da nossa capacidade de excretar as inconveniências, as coisas que não conseguimos assimilar, aquilo que é supérfluo e tóxico. Sem essa faculdade não conseguimos sobreviver e nem o regaleco foge à lei.