O Desenho da Morte
Desenhei um abraço em volta do rasgo aberto do teu pescoço, numa transfiguração comovente da morte. A revolução oscila entre dois palhaços que choram torrencialmente no palco, cravando facas um no outro. O sangue esguicha para a plateia e cria a rotina de seduzir as bocas. A gravata sabe-me a ferro, por isso te amo como és, tão fácil de matar. Todos os laços dos enforcamentos têm a forma do útero, porque é lá que começam a afirmação e o repúdio. O cinto é a vergonha do nu e quando a loucura é mais um na fila transforma-se na corda que faz secar a vida. Somos galos que cantam ao entolecer! Um bando de bicos de galinha responde à chamada e limpa todas as ervas daninhas da nossa alma, mas transforma-as em esterco. É o mundo que nos chama e nos massacra, contraditório como a inteireza fragmentada dos caprichos.
Ai, Guillotin, Gillotin! Fizeste do abraço uma lâmina oblíqua para uniformizar as penas e acelerar a morte e Paris tornou-se um amontoado de decapitados. Mancharam o teu nome com a máquina exterminadora da revolução e não o conseguiste limpar. Mas ri-te da suprema ironia: o primeiro a concretizar o teu engenho foi um construtor de violinos.