o anel

27-06-2017 23:32

 

O anel que te dou, meu amor, é redondo como a perfeição dos corpos celestes do firmamento ingénuo de Ptolemeu. Possui a dinâmica do fogo, a pureza dos cristais e todos os sentidos com que me podes acolher rodam na sua curvatura límpida e sem atrito. Podes espreitar através dele e ver a infinita extensão de tudo o que é prometido, a fornalha inesgotável da nossa paixão. Sim, meu amor, ele espera sofregamente que mergulhemos para fundirmos as nossas peles e incendiarmos os lábios com beijos sem pausa e também para esperarmos pelo outono, onde toda a nostalgia do que nos deu vida emerge como cheiro da terra molhada. Visto assim de tão perto, como nós o vemos, o tempo fica tão grávido do presente que se preserva pela eternidade. Mas é por isso mesmo que te aviso, meu bem supremo, meu amor. O mesmo anel que te ofereço e é nave espacial voluptuosa, está corrompido por um centro que é vazio e negro e, por mais que se disfarce com a aparência luminosa, germina no interior uma fome monstruosa da tua liberdade. O núcleo do compromisso é uma boca faminta com dentes de tubarão, contra os quais não vale a pena lutar porque se renovam indefinidamente. Por isso te aconselho, meu amor, cheio da vontade de que não o faças: foge do meu fogo, da minha joia, da inevitável prisão que lhe cresce no ventre.