Máscara
A máscara é um predador com focinho de mamífero e crânio de nave espacial. Dizem que é a verdadeira mãe dos homens, que estes não existiam antes de a colocarem sobre o rosto e de se esconderem deles próprios e dos outros. Um deles encontrou-a certo dia entre os fumos de uma gruta, ainda imaterial mas já carnívora, predadora de animais ingénuos, azul dos vapores das ervas, e ela saltou-lhe imediatamente para a face e fez-se concreta com os excessos e os defeitos da sua pele. Mas de tão sólida que se pariu tornou-se mais humana do que os homens e deu-lhes os altos voos da civilização. Eis o primata verdadeiramente bipolar: duas pernas, duas mãos, duas tetas e duas caras. Antigamente era apenas um bicho tímido e frágil, mas agora seduz os seus iguais, dissimula-se entre eles, imita-os e confunde-os, mente e caça-os, pois são eles as suas presas principias. A máscara aprimorou os gestos e fez do bando uma explosão de equívocos, de promessas e de furtos. Viaja nos amplos horizontes das comezainas em grupo e nos labirintos escusos da moral. Tem a natureza da promessa e o gume da faca e se algum dia abandonar a humanidade não restará pedra sobre pedra.